segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Morte e Vida Severina

O que fazer com o medo
Estou com medo
Estou com medo
Estou com medo
Acorda com medo
Dorme com medo
Insiste no medo
Medo da doença
Medo da saúde
Medo da alegria
Medo da tristeza
Quando está alegre fica triste
Quando está triste fica alegre.
Quando está bem, tem medo de ficar mal.
Quando está mal, tudo que quer é ficar bem.
E assim vivia Severina
De noite e de dia
A sofrer por algo que não existia.
Acordava sem ar
Pulava da cama e pensava
O que tenho hoje
Checava seu corpo
Via se estava tudo em ordem
De que morreria aquele dia?
Não encontrava nada, mas se encontrasse algo, comum assim de um vivente,
Severina morria!
Sem respirar, sem,
Viver.
Somente a pensar
O que vou fazer e
Danava a ligar para todos os conhecidos
A anunciar sua morte por sem nenhum motivo
Contava suas mazelas e as pessoas a mal escutavam
Já acostumadas estavam,
Ela que fora uma mulher interessante
Agora de interesse já não tinha nada
Severina coitada,
Sem mazelas já não sabia viver
Seu marido mal a olhava
E o filho só a avacalhava
Ela perguntava
Tem catarro filho?
E ele escarrava,
Só para satisfazer Severina.
Mas quando o medo tomou conta dela, de fato
Ela perdendo as pessoas que a rodeava
Ficou somente com a sua fidelidade
A essa sua neurose querida, ela jurou amor eterno,
E não admitia perde-la,
Tudo por ela,
Corria legas envolta do quarteirão
Suando
Morrendo
Mas mantendo-a.
Coitada da analista
Já não agüentava ouvir mais,
A sua neurose, era caso de amor profundo.
Severina jurou no altar, fidelidade.
Andava de braços dados
Agarrada
Andava, chorava , sofria
Mas Severina jurou fidelidade
Tome uma atitude mulher!
Ou ficará assim, até que a morte as separe?

E separou.

Severina ficou só.
E agora Severina?

E agora?
Terá de matar-te para nascer outra,
Ou morrerá de você mesma

E agora Severina????????

Cotidiano

O trem abre as portas e todos entram,

Eu fico a pensar como agüentam,
Entra feio, entra bonito,
Entra alto, entra baixo,
E aquele perfume, que uma vez você encostando nunca mais se recupera.
Começam, entrando todos, por aquelas portas até tocar o sinal.
A porta vai fechar!E eu me pergunto,
Como?
A gorda entalada entre o ferro e o banco, seu corpo se ajustando, com suas banhas a modelar suas esperanças.
Têm de tudo, os que se aproveitam para encostar,
Os que aproveitam para peidar,
Achando que ninguém sentiu.
E, aqueles que fazem, aquele barulho irritante nos dentes tentando tirar um fiapo sabem Deus há quando tempo.
Elas se sentem lindas, eles poderosos.
Têm também, aqueles que fingem que não estão olhando, você olha e pronto,
Eles desviam o olhar,
Começou a redenção,
Ela fica com vontade de olhar, só pela curiosidade de saber se a pessoa está olhando.
Pronto! Olhou,
Claro! Foi pega. Uma mistura de susto e raiva,
Ficará com dor no pescoço o resto da viagem, pois para aquele lado não poderá olhar mais.
E o pior, o trem para na próxima estação,
A plataforma lotada
As portas se abrem, e quem está dentro não consegue sair, e quem está fora consegue entrar,
A situação vai ficando cada vez pior
O nariz coça
Mas a mão está entalada entre a perna de um e de outro,
Então com um enorme esforço, começa a liberá-la,
Mas entala novamente, embaixo de uns peitos enormes siliconados, e não há meio de se chegar até o nariz.
A coceira aumenta e lá vai um espirro, e todos falam:- calma ai! Meu irmão, vai espirrar logo agora?
E lá vai a secreção ,elegantemente falando, ficou grudada num cabelo lotado de laquê,
Estará para sempre perdida.
Socorro ainda chama isso de vida?
Duas horas de viagem
Pronto! O ponto final.
E ai sim, começa o dia,
Para a tal corrida,
Para pegar o trem de volta,
Quem sabe chegando cedo, ainda consiga entalar-se, sentar entre bundas e peitos.
E assim volta para o seu lar
Para o marido nem olhar
Faz a janta
Abre as pernas
E vai deitar
Para no dia seguinte tudo mecanicamente recomeçar
E rezar para o trem não parar
Pois senão terá de pensar
Pois o trajeto mudará
E ai meu irmão?
Como é que ficará?
Realmente terá de pensar
Até tudo recomeçar.

Vida Vazia

Eu que sempre tive tanta vida Onde estou?
Perdas
Meu pai morreu, minha mãe morreu,
Meus avós morreram
E eu estou viva
Fui criada para o afeto, nunca pensara, e o tempo todo pensara na morte,
Isso devido ao amor que sempre tive pelas pessoas que me rodeavam,
Passei a vida a procurar um objetivo
Olhava em volta e não encontrava nada
A dor do Artista
A minha dor
Sabe o que significa você saber fazer arte e não conseguir?
Sabe o que significa você acordar e não ter objetivo?
Sabe o que significa as pessoas te darem mil conselhos e nada, você não conseguir?
E ai amanhece
E ai anoitece
Uns dizem: É o luto.
Outros dizem: Falta fé.
E mais outros, e outros.
As opiniões são muitas
E eu?

Eu Vazio

Nada tem graça
Saudade talvez
Cansada, pode ser,
Ausente jamais!
Atenta a dor
Atenta a prisão
Atenta aos que simulam não sofrer
Atenta a minha paralisia
O que fazer
Saudade de que?
De mim?
Não sei quem sou, muito menos quem fui
Pois sempre fui um projeto p/ o amanhã
O hoje nunca existiu
E assim num elo perdido tenho caminhado
Escrevo para não enlouquecer de mim mesma
Escrevo para viver
Para aprender com o meu eco
Para aprender com a minha surpresa
Para aprender a desejar
Para aprender realmente como se vive.

Solidão

A solidão da existência A angustia da solidão
Faz-me pulsar de vida!
Faz pulsar meu coração
Sufoca-me a garganta
Pelo grito que não consigo dar
Sufoca-me de medo e pânico pela opção.
Solidão essa que ameaça os seres,
Que já não fazem parte das amarras medíocres
Solidão, que me faz bailar na vida,
Sorrir na vida! Que me faz ir, ir, ir, para não me enforcar,
No meu próprio sintoma.

Aqueles Dias

Aqueles dias que a gente nem sabe de nada
Aqueles dias que da vontade de chorar
Aqueles dias que um suspiro não sai
E a saudade aumenta
Trabalhar ajuda, mas não consigo.
Eu andava
Sorria
Mas não conseguia
Quem olhava nem imaginava, pois tinha uma capacidade de sorrir.
E como fica
Sorria tanto para que?
Para substituir uma dor
Sorria naqueles dias inclusive
Que a vontade era gritar de dor da alma
Sabe aqueles dias que você tem
Saudade da infância
Saudade do colo de mãe
Saudade de se sentir amada, com a cama feita e deitar gostoso sem sentir desamparo?
Saudade de um mundo melhor
Um mundo onde as pessoas parem de olhar só para si
Sabe aqueles dias que você tem um nó
Que você telefona para varias pessoas, e estão todas ocupadas e você descobre que você é única desocupada.
E elas te perguntam: quando é a sua próxima sessão de análise?
Sabe minha alma está sofrendo
Eu sei que estou crescendo
Mas eu não sei bem o que faço comigo
Onde está o meu desejo?
Onde estou eu?
Eu hoje sou um conjunto daqueles dias, que as pessoas nem querem escutar, pois elas assim teriam que se deparar com o próprio fracasso.
É mais fácil perguntar quando é a minha próxima sessão
Assim a fala se cala
Um dia deixarei de ser otária
Conseguirei jogar tudo para o alto e viver
Quem sabe eu consiga fazer isso tudo,
Antes de envelhecer.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Era dia de sol

O morro acordava
Crianças brincando ainda com alguma ilusão.
Dona Maria colocando as roupas brancas do seu filho para alvejar.
Esse tentava ganhar a vida honestamente,
Trabalhava na repartição pública
Enquanto o outro, se perdera há muito,
Ele cuidava do tráfico.
Como pode dona Maria?
Dois filhos tão diferentes?
Amanhecia, tiros começaram a vir do céu,
Centenas, milhares de tiros,
A policia, sem piedade,
Atirava para matar
E as crianças a correr
As donas Marias, a pegarem seus filhos assim como se tenta salvar uma cria.
E os tiros
E os tiros
E os tiros
Davam uma trégua,
E Ai dona Maria?
E era seu filho que eles queriam
E agora dona Maria,
Teria de suportar a dor
Pois eles o achariam
Como?

Eles trocavam tiros e tudo acontecia
As crianças gritavam, as mães choravam,
Os ladrões tinham medo,

E os aviões voavam.
Balas eram atiradas
Como troféu da violência
Sem respeito ao outro
Sem respeito à dignidade
E depois de muitas horas
E ai dona Maria depois de muitas horas o seu filho mataram
O morro silenciou
O pranto se estendeu
E o grito de mãe
Fez-se ouvir pelos quatro cantos
Quando amarraram o seu corpo
E o exibiram igual a um troféu pelas ruas da cidade
Quando passava
Pendurado assim
O povo dizia
Bem feito
Lá vai mais um
Mas se esqueciam que atrás daquele corpo existia dona Maria
Que corria enquanto o corpo do filho pendurado passava
Queria alcançá-lo
Afaga-lo
Mas assim o levaram
E ela nunca mais soube dele
E amanheceu
Ela voltou para o tanque
Para lavar a roupa,
Pois seu filho,
Vai trabalhar
A roupa tem de estar branca
Mesmo que a alma esteja suja de sangue,
Do filho que partiu.
Ela estende a roupa para alvejar
E começar a rezar
Para esse filho nunca mais parar de trabalhar.

Limite

Quando penso no que significa de fato criar alguém
Fico assim pensando como pode
Somos jovens também
Como não errar?
E como seria acertar?
Não me deram à receita
Como lidar com a frustração
Do fracasso não ser só seu,
Ser meu também.
Como lidar com as drogas,
A violência
As notas,
A grana.
Gostaria tudo de te dar
Mas o tudo corrompe
O nada corrompe
Gostaria de acertar
Amor
Conversa
Às vezes tenho medo de errar
Noites de sono perdida
Talvez você esteja preparado, eu não ainda.
Onde andará você agora?
Em que madrugada?
E o que faz?
Será que o que aprendeu
Com o meu afeto foi o suficiente?
Não dorme em casa
Mas está tudo bem
Será que acertei na medida
Ah! Percebo que errei
Não de todo,
Mas tem os mesmos defeitos que eu,
Socorro!Será que ficará igual a mim?
Não! Não deixarei.
Socorro!
Corro para te dar aquele limite que não aprendi, ou aprendi e não usei.
Corro para te salvar da frustração que sinto.
Corro para te dizer:
Para!
Chega!
Não foi tão difícil
Nossa! Ainda tenho seu amor
Nossa!Você não esta me odiando
A casa continua no lugar
Que bom
Mas não seremos mais o mesmo
Separamo-nos hoje
Eu te livrei da minha neurose
E assim crescemos os dois
Pois ainda somos jovens
Você mais,
Eu ainda
Mas sobrevivemos ao corte
E agora?
Cada um contará a sua história
Bem mais criativa
Bem mais construtiva
Sem ser colado
Sem ser oprimido
Apenas sendo
E a receita?
Está no experimento
No afeto
No perdão
Na insistência
NO BEM QUERER!

Para Caetano , meu filho.

Minha Mãe



colagem denise terra


Ai que saudade de ti minha mãe
Que saudade dos tempos que não voltam mais
Se eu soubesse que de fato você iria morrer
Eu te teria aproveitado mais.
Saudade do telefone que não toca,
Saudade de você dizer:
Oi é a mamãe!
Saudade de não ter seu colo, nem sua voz.
E a sua esperança
Porque você não contava o que sentia,
Ou não sentia.
Sabe mãe, se eu pudesse falar com você, te diria para viver.
Te pediria para largar o sofrimento
Te diria para ter coragem
Te diria para enfrentar a vida
Tudo para que pudesse ter ti por mais algum tempo
E ai fica essa loucura de sofrimento
E eu não consigo falar nem para mim, as coisas que eu te diria,
E o pior eu não consigo nem viver bem,
Com a saudade que sinto de ti.

O Cais do Porto


colagem denise terra.


A melancolia de se deparar
Com os dedos dos pés endurecidos a beira do cais do porto,
Sem ter a coragem de vir o próprio corpo se estilhaçar na água
A melancolia de perceber que nada tem sentido e não conseguir acabar com tudo isso de uma vez.
Perder a neurose
Ter medo da psicose
Se sentir só
Desamparado
Completamente pó
Estar nas cinzas e ver ainda alguma cor
Viver a angustia de ser
Viver sabendo da condenação
Da finitude.
E mesmo assim com um sorriso no corpo
Tentar um sentido
Ficar paralisado
Ficar amedrontado
Ficar horrorizado diante de um destino sem destino,
Apenas pré- determinado
E ter que dar a volta
Perder tudo
E sofrer na alma,
Pois nem o divino, nem a divindade existem mais,
E desta, tirar a ultima gota de suor diante das vísceras dilacerada.
E para não se morrer! Vivo!
Jogo-me num abismo jamais conhecido
Grito com os olhos arregalados de susto, que existe uma possibilidade de suportar o vazio,
Chamada desejo
Somente assim seremos fieis a nossa finitude.